segunda-feira, 23 de maio de 2011

A música como produto

Escrevo esse texto mais como um desabafo do que, propriamente, com o propósito de argumentação. Trata-se de um assunto delicado, que envolve temas como música, arte, marketing, comércio, profissão e sobrevivência. Por isso, não se esgota aqui; ao contrário, é apenas o início de um debate que precisa ser amadurecido em nossa sociedade.

Contextualizando: tudo começou com um vídeo musical que virou febre na internet. A música chamada "Oração" da banda curitibana “a banda mais bonita da cidade” foi postada na internet na semana passada, via You Tube, e já teve mais de um milhão de visualizações, além de ter se tornado um "viral" em meio às redes sociais. Os jovens músicos apostaram no “fofo” e no “meigo” na letra e melodia de “Oração” e – motivo de polêmica – praticamente “copiaram” o também conhecido clipe da banda Beirut (veja aqui o video da banda Beirut), assumindo na descrição do vídeo (postado abaixo): “é, a gente adora Beirut mesmo”. Veja:



As críticas vieram tão rapidamente quanto aos elogios. Se milhares de pessoas “curtiram” e compartilharam, por outro lado, alguns acusavam a banda de “bobinha”, por seu estilo alegre. Um dos internautas arriscou o depoimento “essas bandas "moderninhas" parecem querer habitar um plano mais elevado que o nosso, fazendo (sempre) alguma coisa simples-doce-meiga-ingênua-cult...” e continua “todas são mais ou menos parecidas (até essa tal Beirut) e veneradas por um grupo que é igual à banda, do corte de cabelo ao discurso... fica aquela atitude (?) blasé "vamos tocar na rua/praça pública porque é cult”. Outros, indignados com o suposto plágio, atacavam os jovens que tentam fazer uma música.... para vender!

Aqui entramos no foco da discussão que gostaria de propor. Primeiramente, quero ressaltar: não vamos entrar na questão de gosto musical, porque cada um tem um. O meu, por exemplo, é tão eclético que vai de música clássica, como Mozart, Vivaldi e Chopin ao som pesado de Rage Against The Machine, passando por bandas alternativas como Camera Obscura, tristes como Nick Drake, de rock como Dave Matthew's Band, politizadas como Moby, “bregas” como Belchior, de black metal como Burzum amplamente conhecidas, como Rolling Stones. Escuto o que agrada meus ouvidos, sem rótulos e sem levantar bandeiras. E confesso: gostei da música Oração.

Mas a questão é que a banda, que a princípio fez uma música “comercial”, foi atacada por alguns que dizem não se tratar de arte. Aqui, aproprio de algumas palavras que encontrei pela internet para descrever o que penso: “Existe arte e existe entretenimento. Qual é o problema de existirem os dois? E quem falou que a banda visava criar um objeto de arte? Eu não sei”. Se visavam ou não, eu também não sei, mas isso não desmerece o que fizeram, na minha opinião. Quiseram criar uma música e divulgá-la; quiseram tornar-se conhecidos. Seria pretensão julgar os trabalhos de outros e classificá-los ou não como arte; com base em que?

Acho atrasada a discussão que alguns grupos levantam de que só são “bons” aqueles que não fazem músicas “comerciais”. Ora, todo músico quer ter suas músicas conhecidas, nem que seja em meio a um público segmentado. Se não, tocariam por “arte” ou por mero prazer nas garagens de suas casas, e não se esforçariam para publicar vídeos na internet ou criar perfis no My Space, ou divulgar músicas pelo FaceBook. Então, não dá para fazer música só para si mesmo e cair no argumento (este sim, blasé) de que “minha música é para poucos”.

Claro que, infelizmente, nem tudo que vende é bom (na minha modesta opinião, 10% ou menos do que é amplamente vendido e divulgado é bom). Temos muitas bandas e cantores que são frutos de uma bela produção de marketing e não fariam um bom som ao vivo porque não são músicos de verdade. Mas, também, nem tudo que é underground é bom! E nem tudo que vende é ruim! Falta um pouco de raciocínio lógico aqui: existe um grupo enorme de boas músicas e bons músicos; dentro deste grupo, existem subgrupos: das músicas comerciais, das músicas não comerciais. Estes dois, também se subdividem, e assim sucessivamente. Assim, uma coisa não exclui a outra: ser bom não é sinônimo de não ser comercial, a exemplo de bandas belíssimas e famosas, como The Doors, The Beatles, dentre outas. É questão de gosto!

Tenho amigos músicos e vejo da seguinte forma: ser músico é uma profissão como outra qualquer, e faz-se necessário algum sacrifício. Para obter sucesso, muitas vezes é preciso sim abrir mão da vaidade e apostar em algo que vai vender (aqui não vamos entrar na discussão da ética, para não nos estendermos demais no assunto). Essa é uma forma eficaz de ter o trabalho reconhecido, de maneira a também promover as chamadas músicas “lado b”, geralmente mais interessantes.

Antigamente, ficávamos reféns das gravadoras e de suas vontades, que gravavam e divulgavam somente o que era vendável. Isso sim era uma limitação terrível. Hoje em dia, agradeço por termos a internet como forma democrática de divulgação de trabalhos para os artistas e de acessibilidade para os interessados. Ouvimos o que queremos, desde as bandas mais conhecidas até as bandas de garagem, graças a essa democratização da informação e do desenvolvimento de tecnologias nos meios de comunicação. É um avanço, e outros avanços estão por vir. Então, creio eu que devemos deixar para trás o pensamento atrasado, polarizado, estilo guerra fria, como se realmente estivéssemos entre bons e maus.

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