terça-feira, 30 de junho de 2015

Dádiva



Algumas pessoas aparecem de forma inusitada na nossa vida e a transformam de forma tão profunda que deixam marcas eternas. A intensidade supera o tempo e, por isso, parece que as conhecemos desde sempre e para sempre. A presença delas nos preenche e compartilhar a vida torna-se uma multiplicação de prazeres e aprendizados. Quando isso acontece, o sentimento transcende rótulos, conceitos e razões. A ligação se dá na esfera da essência e se traduz em afinidades e afeto. Com elas, ficamos em paz, com a mente tranquila e o coração sereno. Nos despimos das máscaras, dos papéis sociais e nos vestimos de nós mesmos. Nos sentimos em casa, bem vindos, queridos, independente de nossas virtudes ou limitações, do jeito maduro ou infantil. O silêncio não incomoda, acolhe. Isso é raro: experimentar a dádiva que é o exercício pleno do amor.

segunda-feira, 29 de junho de 2015

Cânion



Corre em mim, por entre as rochas duras, resistentes e majestosas,
um rio de sentimentos, pensamentos e percepções.
Ele segue seu curso com força e fluidez.

Não é fácil chegar até ele;
para se refrescar ou se deleitar em suas águas claras,
é preciso escalar as paredes do cânion.
Requer força, vontade, coragem!
Uma espécie de seleção natural:
os perrengues desanimam os desinteressados
ou aqueles que se contentam com relações superficiais.

Às vezes, em circunstâncias de chuva forte
ou de obstrução do fluxo,
este rio enche demais.
Quase me afogo em palavras não ditas,
nos sentimentos aprisionados,
em choro contido.

Para essas ocasiões, tenho aprendido a nadar...
respirar, bater pernas, usar os braços.
E quando a correnteza é forte demais,
me deixo levar pelo fluxo, enfrentando o pavor de ser levada.
Melhor do que se agarrar a velhos galhos ou troncos apodrecidos.



domingo, 21 de junho de 2015

É tempo de partir



Vá, meu amigo.

Vá porque seus sonhos são do tamanho do mundo e não cabem em fronteiras. Seus sonhos são de todas as cores e texturas, perpassam montanhas e rios e horizontes sem fim. Eles superam os limites da razão para ganhar vida, pulsando por aí.

Vá porque sua luz precisa brilhar por outras bandas, iluminar caminhos escuros e projetar-se nas luas que encontrar. Irradie sua energia onde estiver, sem economias; contagie as pessoas.

Vá porque ainda há muito o que aprender, e as experiências são os melhores professores que podemos ter. Se jogue em sua existência e sinta tudo com a paixão e a intensidade que merece. Dê asas aos seus 5 sentidos, explore-os! Deguste cada pedaço de chão por onde passar, sinta o cheiro que exala da vida, toque o som do universo, escute o silêncio das palavras não ditas, veja além do óbvio! Seus olhos anseiam por expandir o campo de visão, admirar e sentir outras belezas. Que seu coração possa ser sua lente quando ver as pessoas e a natureza ao redor.

Vá porque a vida é curta, é um sopro. Cada momento é único, é presente, é dádiva. Aproveite-os! Encha seus dias com paixão, alegrias, leveza, risadas e afeto. É aqui e agora que a gente constrói o futuro... Plante tudo aquilo que deseja colher e olhe pra frente com fé e esperança. Os frutos virão! Como diz o ditado, "o plantio é opcional, mas a colheita é obrigatória"; então cultive tudo o que te faz bem e feliz!

Vá porque é tempo de apaixonar-se ainda mais por você mesmo, pelo seu jeito, pela forma de encarar o mundo e de evoluir a partir das vivências. E de apaixonar-se também pelo outro, pelos outros, pelas tantas pessoas que irá encontrar por aí.

Vá porque é tempo de ir, já que você não cabe mais em si mesmo. Vá expandir os limites de seu corpo e mente. Você é um espírito livre, cidadão do mundo; explore-o, conquiste-o. E deixe pra ele o seu legado, contribuindo para torná-lo um pouco melhor do que encontrou. Espalhe suas sementes de força e coragem. Força para romper barreiras e enfrentar obstáculos, coragem para libertar dos medos e encarar as dificuldades.

Não é difícil deixá-lo ir, porque sou daquelas que nunca colocaria passarinho na gaiola. É muito mais bonito vê-lo solto, cantando e voando livremente. Bicho solto volta quando quer, e se volta é porque tem ligação forte com o que deixou pra trás.

Voe, meu amigo, voe alto. E volte quando quiser. As portas e os braços estarão sempre abertos para te receber. Ausências são incapazes de romper laços de afeto!

segunda-feira, 15 de junho de 2015

Nariz no vento, olhar no horizonte

Texto do meu querido amigo Justino Augusto. Tive que me "apropriar" dessa lindeza! 





Trilhas e milhas. Quem sabe encontro alguém pra andar mais eu a segunda milha. E a terceira. E a quarta. E quantas mais e tantas mais. E Que curte mato. E que não questione caminhar em meio a pedras, e atravessar rios de águas cor de chá; que não reclame se a pele arranhar em carmesim; que sorria ao subir montes prá, de lá de "riba", contemplar as pessoinhas lá embaixo, como formigas, ou os caminhos como filamentos, longe; que não tema adentrar cavernas nunca dantes vistas, que se delicie aprofundar-se em poços profundos ocultos entre fendas da montanha. Que alargue os braços prá sentir o vento soprar por entre canions desconhecidos; que não peça por uma cama confortável ao se horizontalizar em solo úmido, que não horrorize por dormir sob a abóboda infinita cheinha de pontos de luz, por vezes sem abrigo, ou ao caminhar por dias sem ver mais ninguém, que não se desespere ao se ver solta num abismo segura apenas por uma tenue corda. Que não tema ao perceber que tem apenas bichos, pedra, água, céu e a mim por companhia. E que goste de mim. (...) Mas se não curtir nada disso, pelo menos que me deixe ir. E me permita voltar. 


quarta-feira, 10 de junho de 2015

Manifesto pela liberdade de ser



Observando as pessoas com quem convivo, a forma de ser de cada um, de agir e reagir, a maneira que enxergam o mundo e a si mesmos, a conduta, os sentimentos e pensamentos, penso: "sou privilegiada, convivo com pessoas incríveis".

Mas ultimamente tenho questionado essa ideia, porque ela me sufoca. Não que as pessoas não sejam incríveis, elas são. Mas colocar nelas este rótulo e dar a elas este papel é, de certo modo, enquadrá-las e encaixá-las em moldes da categoria "incrível". Ou seja, colocar o outro nesse lugar "especial" - que eu mesma criei (idealizei) - é uma forma de querer aprisioná-lo, porque não quero que ele saia de lá, que quebre o padrão de conduta. E ninguém veio ao mundo para ser modelo, para conduzir escolhas e atitudes de forma a atingir as minhas expectativas. 

Quando nos decepcionamos, a culpa não é do outro, é nossa! Porque criamos falsas expectativas e achamos que as pessoas vão corresponder a elas, que vão agir como esperamos. Aí nos frustramos. Além disso, os "escolhidos" por mim podem não querer estar nesse "lugar especial" onde as coloquei. Então, que tal deixá-las serem livres? Serem simplesmente como são, sem rótulos ou enquadramentos?

Eu mesma não quero ocupar nenhum altar. Quero simplesmente ter a liberdade de agir, reagir, pensar e sentir do jeito que quero ou consigo, sem ser julgada por isso, sem ter a sensação de estar "decepcionando". Quero ser verdadeira comigo mesma e, consequentemente, com todos que me cercam. Ser livre, sem prisões subjetivas.



Sobre trilhas e travessias



Quando começo uma trilha, olho para o horizonte e penso em todo o percurso. Ele parece longo demais, difícil, com suas subidas íngremes, descidas cascalhadas, rios para atravessar. Imagino o cansaço, as dificuldades. Mas então, dou os primeiros passos, dou início à minha marcha de passos curtos, rápidos e ritmados. A paisagem é linda, o sol me enche de energia e nada mais importa: estou ali por inteiro, exatamente onde e como queria estar. O destino já não me preocupa, nem o tempo, nem os obstáculos; de corpo e mente presentes, canto, caminho, paro para descansar e admirar as belezas ao meu redor. Toda ansiedade e preocupação desaparecem, tudo é sereno, equilibrado. 

Essas lições das minhas experiências com trilhas e travessias eu tenho tentado levar pra minha vida, de maneira geral. Estar mais no presente, dar um passo de cada vez, viver os dias com leveza e intensidade, aproveitar a jornada (mesmo os perrengues), não antecipar ou adiar momentos e decisões, percorrer o caminho curtindo o que há de bom e enfrentando os obstáculos que aparecerem de forma objetiva e tranquila.